quarta-feira, 2 de maio de 2012

A Beleza e a Dignidade na Liturgia Eucarística - parte IV


I – A beleza dos gestos e das atitudes: O santo padre João Paulo II exortava os cristãos a deixarem transparecer a fé por sinais exteriores. Por isso, toda a assembléia litúrgica deve demonstrar seu respeito e adoração a Deus pela dignidade de seus gestos e posturas. Principalmente o sacerdote celebrante, e os ministros que o auxiliam, devem agir sempre com deferência aos sagrados mistérios. Movimentos sóbrios, genuflexões e inclinações, conforme indicam as normas, demonstram o respeito às coisas sagradas e também o sentido de serviço à liturgia, pois ela não pertence ao celebrante e nem mesmo à comunidade.
O mistério eucarístico deve ser celebrado em clima de oração e reflexão, e não afoitamente. O Missal pede a dignidade dos gestos, para que exprimam a unidade dos fiéis e para que ajudem a entender melhor o sentido de cada parte da missa. “Os gestos e posições do corpo, tanto do sacerdote, do diácono e dos ministros como do povo, devem contribuir para que toda celebração resplandeça pelo decoro e nobre simplicidade” (Instrução Geral sobre o Missal Romano [IGMR], 42).
II – Respeito às normas litúrgicas: O sínodo dos bispos de 2005, que refletiu sobre a Sagrada Eucaristia, dedicou atenção à ‘ars celebrandi’, a arte de celebrar retamente os santos mistérios. Respondendo aos anseios do sínodo, o papa Bento XVI escreve que a ars celebrandi está, primordialmente, na fiel obediência às normas litúrgicas propostas pela Igreja (Cf. Sua Santidade, Bento XVI - Exortação Apostólica Pós-Sinodal Sacramentum Caritatis, 38). “Normas litúrgicas ajudam a proteger a celebração dos mistérios sagrados, especialmente a Sagrada Eucaristia, de serem danificados por adições ou subtrações que danificam a fé e podem, por vezes, até tornar uma celebração sacramental inválida. O povo de Deus tem, assim, celebrações garantidas na linha da fé tradicional da fé Católica e não é deixado à mercê de idéias pessoais, sentimentos, teorias ou idiossincrasias” (ARINZE, Francis Cardeal. Prefeito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos. Discurso para o “Gateway Liturgical Conference”, em 8 de abril de 2005).
III – A orientação da Liturgia: Durante a maior parte da vivência litúrgica da Igreja, o Santo Sacrifício foi celebrado em direção a Deus. Os altares eram primeiramente construídos buscando-se o oriente, na direção da Terra Santa. Isso era simbólico da presença divina. Mais tarde, o Sacrário ocupou esse lugar, na abside. Também os ritos orientais mantêm, até os dias atuais, tal orientação. Estando à frente do povo, voltado para o altar, o sacerdote manifesta claramente a sua função e sua dignidade inigualáveis.
“A abside orientada evoca o céu. Será reservada obrigatoriamente para uma imaginária celestial. Isto é válido não só para as igrejas do Oriente, mas para as absides de nossas igrejas românicas. O sacerdote, ao celebrar no altar, verá, se levantar os olhos, alguma representação simbólica da glória celestial, alguma evocação teofânica em relação com a Escritura. Celebrará verdadeiramente de frente para Deus. Quem não sente que tal disposição convém admiravelmente a tantos textos do Ofertório e do Cânon?” (FOUMÉE, Jean. A Missa de Frente para Deus. Tradução de Luís Augusto Rodrigues Domingues).
Manter essa orientação da liturgia é altamente significante, e contribui sumamente para manifestar a beleza da celebração, porque traduz certamente o sentido de certas partes da missa, que são voltadas para Deus, e não para os homens. Apesar de ser, em algumas ocasiões, útil que o sacerdote se volte para o povo durante a celebração.
IV – Valorização da língua latina: Há séculos o latim é a língua oficial da liturgia de rito romano. A Igreja sempre encontrou variadas razões para manter o uso da língua tradicional na celebração da Eucaristia, e mesmo dos outros sacramentos. O latim é uma língua imutável, visto que não sofre alterações normais a uma língua ‘viva’, o que o torna ideal como ‘guarda’ da doutrina cristã, mantendo sempre constante o significado de palavras e expressões. “O uso da língua latina, vigente em grande parte da Igreja, é um caro e nobre sinal de unidade e um eficaz remédio contra toda corruptela da pura doutrina” (Sua Santidade, Pio XII – carta encíclica Mediator Dei, 53).
Além de guarda da doutrina, o latim certamente contribui para enlevar os fiéis, uma vez que traduz um sentimento de se estar em um outro lugar durante a liturgia, manifestando certamente o caráter escatológico da celebração, conduzindo os presentes ao céu: Hic domus Dei est, et porta caeli! (Gn 28, 17) - Esta é a casa de Deus e a porta do céu. O Concílio Vaticano II ordenou: “deve conservar-se o uso do latim nos ritos latinos” (Concílio Ecumênico Vaticano II, Constituição Sacrossanctum Concilium, 36), e também pede: “tomem-se providências para que os fiéis possam rezar ou cantar, mesmo em latim, as partes do Ordinário da missa que lhes competem” (Idem, 54).
V – O canto gregoriano: Um fator especial na liturgia é o canto. A execução cantada de algumas partes contribui especialmente para o enlevo espiritual dos fiéis e para uma mais frutuosa celebração, sendo o canto litúrgico é um verdadeiro ofício a ser desempenhado. Desde as épocas mais remotas foi preocupação dos Santos Padres formar escolas de canto, e com o desenvolvimento da liturgia surgiram muitos estilos musicais, de grande aproveitamento. Entretanto, o canto gregoriano ocupa lugar de destaque na Liturgia, por ser a síntese de todas as características que se esperam da música sacra.
As qualidades artísticas presentes no gregoriano são fatores importantes para a composição da beleza na celebração. Ele é uma arte verdadeira, sendo caracterizado pela santidade e pela coerência para com o momento celebrativo, especialmente por não causar uma sensação desagradável. “O canto gregoriano foi sempre considerado como o modelo supremo da música sacra, podendo com razão estabelecer-se a seguinte lei geral: uma composição religiosa será tanto mais sacra e litúrgica quanto mais se aproxima no andamento, inspiração e sabor da melodia gregoriana, e será tanto menos digna do templo quanto mais se afastar daquele modelo supremo” (Sua Santidade, Pio X – Motu Proprio Tra Le Sollicitude, 3).
O canto gregoriano faz-se mais necessário hoje, com a visível banalização da música litúrgica, sob a influência das correntes musicais modernas, tornando os cantos ‘litúrgicos’ de duvidoso gosto artístico. O gosto musical da geração atual, movido por uma certa mutação cultural, foi “corrompido e degenerado, a partir dos anos 60, pela música rock e por outros produtos semelhantes” (RATZINGUER, J/ MESSORI, V. – A Fé... Pág. 96). Aqui também o Concílio se pronuncia: “A Igreja reconhece como canto próprio da liturgia romana o canto gregoriano; terá este, por isso, na ação litúrgica, em igualdade de circunstâncias, o primeiro lugar” (Concílio Ecumênico Vaticano II, Constituição Sacrossanctum Concilium, 116).

Autor: Matheus Roberto Garbazza Andrade
Publicação original: Dezembro de 2008
Extraído de: http://www.sociedadecatolica.com.br/modules/smartsection/item.php?itemid=325

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